segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

Custo alto é o nó da matriz hidrelétrica

RUY BAHIA - Professor da UFPA

Na primeira parte da minha palestra, proferida em 27 de janeiro de 2007, para o Conselho de Desenvolvimento do Estado (CDE), a convite do seu presidente, engenheiro Lutfala Bitar, apresentei os requisitos de investimentos para as alternativas de expansão da oferta de geração de Energia Eétrica (EE) nas versões de Matriz Hídrica e Matriz Hidrotérmica no períodos 2000-2030 e 2030-2050. Volto a prestar esclarecimentos e constestações relacionadas ao conteúdo da matéria de autoria do professor Nagib Charone publicada em O LIBERAL de 7 de fevereiro de 2008, sob o título 'A Pesquisa da Amazônia na contramão'.
Para o período 2000-2030, e no caso da Matriz Hídrica, com 88% de participação de hidrelétricas, os custos de investimentos em capacidade instalada alcançam US$ 375 bilhões. No caso da Matriz Hidrotérmica, para uma mesma oferta de expansão de EE, os investimentos somam o total de US$ 180 bilhões, com as participações igualadas em 50%. Ocorre, portanto, um sobrecusto de US$ 195 bilhões. Esse sobrecusto deverá ser acrescido para US$ 292 bilhões (US$ 9,7 bilhões/ano) considerando as atualizações de JDC (Juros Durante a Construção) das hidrelétricas. Os investimentos na Matriz Hídrica não tem sustentabilidade financeira devido à insuficiência de disponibilidade de recursos financeiros da estatal ELB e do BNDES observada nos últimos anos. Em 2007, os investimento na Matriz Hídrica deveriam ter sido de cerca de US$ 9,3 bilhões, sendo que somente cerca de US$ 3 bilhões foram investidos (33%). Essa carência de investimentos gerou uma extremada sensibilidade às variações hidrológicas naturais que são imprevisíveis e que são os principais riscos de apagões e portanto típicos da Matriz Hidrica. Esses riscos de apagões estarão minimizados no caso da Matriz Hidrotérmica, que por ser diversificada ( 50% x 50%) tem pouca ou nenhuma sensibilidade às variações do ciclo hidrológico e com reduzida intensidade financeira e de maior confiabilidade quanto aos riscos de apagões.
Demonstrada as inviabilidades da Matriz Hídrica com aquele intolerável sobrecusto de US$ 292 blhões, passei à exposição do tema complementar da minha palestra: 'A eficiência hidroenérgética das barragens na Amazônia - casos Balbina, Tucuruí e Projeto Belo Monte', com acentuadas ineficiências, sendo que no caso de Belo Monte, a ineficiência hidroenergética é ainda mais acentuada em relação a Balbina, e que combinada com as inviabilidades típicas da Matriz Hídrica condenam os projetos de hidrelétricas na Amazônia e em particular o Projeto Belo Monte, citado com falsas justificativas de evitar apagões nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste do País.
Confirmo a minha afirmativa de que as recentes anunciadas mega descobertas de óleo e gás natural (GN) nos projeto Tupi e Júpiter são fatos concretos e não simples 'estudos'. No caso da mega descoberta de GN em Júpiter, com dimensões de área do tamanho de jazida 50% superior e espessura do reservatório duas vezes maior em relação a Tupi, já justificam a prioridade já estabelecida pela Petrobrás para realizar um teste de produção de longa duração, para avaliar e definir parâmetros como o volume de óleo leve condensado associado ao GN (razão gás/óleo), que comprovem a esperada reserva provada da jazida, para então estabelecer as estratégias e planejamento de investimentos para o escoamento dessas reserva para o mercado Sul, Sudeste e Centro-Oeste. Inclusive para avaliar o potencial da complementação da expansão da oferta de GN para a geração de EE, independendo da importação da hidreletricidade da Amazônia.
O desenvolvimento tecnológico petrolífero é um processo de contínua evolução que ocorre durante a exploração/explotação das jazidas. Assim tem ocorrido na Bacia de Campos e certamente ocorrerá na bacia do pré-sal de Santos. Segundo recentes pronunciamentos, a diretoria de Exploração e Produção da Petrobrás não considera restrições ou limitações tecnológicas para a produção e escoamento do GN de Júpiter, restando somente o risco financeiro de uma queda dos preços do barril de petróleo abaixo dos US$ 60 a US$ 70 o barril, que criará obstáculos nos fluxos de caixa dos desenvolvimentos dos projetos no pré-sal de Santos, o que parece ser improvável, considerando a prevalência da instabilidade geopolítica dos paises produtores do Oriente Médio e da continuidade de aumento de demanda da China e Índia pelas próximas décadas.
CONFIABILIDADE
Reafirmo portanto o que declarei na minha palestra para o CDE: o atendimento da demanda de EE nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste independe das hidrelétricas da Amazônia, podendo ser realizado com menores riscos de apagões e maior confiabilidade com o GN do Projeto Júpiter já a partir de 20 de dezembro de 2013.
Demonstra-se claramente com os gráficos de 'Mid-points' (ponto médio) na hipótese mais provável de ROR (Reserva Original Recuperável) de 80 Gboe (Giga barril de óleo equivalente), que as reservas remanescentes de GN só passarão a declinar a partir do ano 2050, com o esgotamento ocorrendo para além dos anos 2060-2070. Não ocorrerá portanto o citado esgotamento imediato dessas reservas remanescentes de GN. A nível internacional não se conhece além dos paises árabes do Oriente Médio, país algum que esteja cometendo o 'suicídio' de desenvolver-se com somente a queima do petróleo ou GN. No nosso caso a queima de GN para a produção de EE complementar às outras fontes não corresponde em nenhuma hipótese a um 'suicídio'.
As reservas de petróleo não são finitas e nem se esgotarão em menos de 50 anos. No mundo energético, as fontes não se esgotam e sim são substituídas com alternativas mais eficientes, que são os casos da lenha substituída pelo Carvão Mineral (CM) e essa fonte pelo petróleo, que deverá ser, no futuro longínquo, parcialmente substituído por hidrogênio. Quanto às possibilidades de aproveitamento de CM são problemas e não soluções, em paises que tem grandes reservas como China, Índia e EUA, porem com tecnologias de elevado custo, porém sem soluções de descarte das cinzas contaminantes (ver Revista Brasileira de Energia v. 12 no.2 p. 27-47). O Brasil sem reservas de CM de boa qualidade não tem esses problemas de aproveitamento. Quanto à 'Energia do Futuro' (Scientific American), os futurologistas expressaram suas opiniões sem considerar o uso o petróleo ou do GN como solução global e sim em cenários pós 2030-2050, de declínio dessas fontes e suprimento de energia em bases predominantes de outras fontes alternativas ao petróleo como: hidrogênio, fissão e/ou fusão nuclear, solar, biocombustíveis etc. Vale a pena uma releitura desta matéria.
BALBINA
Quanto ao mencionado elevado potencial hidráulico de 60 GW, só no Pará, é oportuno esclarecer que esse potencial só terá importância econômica quando demonstrada a sua viabilidade financeira e econômica. Sem essas prévias avaliações e insistindo nesses aproveitamento não avaliados, estaremos simplesmente repetindo Balbina, que é um exemplo didático de aproveitamento de potencial hidráulico sem viabilidades. Essa simples citação de potencial de 60 GW sem definição como reserva hidráulica viável é um equivoco que deve ser evitado, pois induz à falsa idéia de que todo ele é aproveitável, o que não é definitivamente verdade.
Finalmente declaro minha satisfação em ter debatido esses temas de energia com o qualificado professor Nagib Charone, da área acadêmica universitária, reconhecendo que sempre há espaço para aprendizado nesses debates, tendo porém o cuidado de esclarecer no título dessa minha matéria que: não é a pesquisa da Amazônia que está na contramão e sim a inviável Matriz Hídrica, com suas inviabilidades como claramente por mim demonstradas.
(O Liberal - 24/02)

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