domingo, 21 de outubro de 2007

Energia alternativa não decola

Letícia Lins e Isabela Martin

O Brasil pode melhorar sua imagem ambiental no exterior, se der à energia eólica tratamento igual ao que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva vem dispensando aos biocombustíveis em suas andanças pelo mundo. Para isso, seria preciso apenas que o governo fizesse leilões para comprar mil megawatts (MW) anuais gerados a partir do vento. Com a iniciativa, induziria o setor privado a injetar por ano US$2 bilhões na economia e reduziria o risco de apagões.
A avaliação é de Everaldo Feitosa, vice-presidente da Associação Mundial de Energia Eólica, com sede em Bonn, na Alemanha. Os leilões, diz, são uma oportunidade para fazer "uma revolução movida a vento", capaz de transformar a Região Nordeste. É lá que foram identificadas as melhores condições para o desenvolvimento desse tipo de energia no país. O Brasil tem potencial para gerar 200 mil MW de energia eólica, mas a capacidade instalada atual é de somente 200MW.
- As jazidas de vento do país estão entre as melhores do mundo. Temos ventos bem comportados, enquanto as jazidas dos Estados Unidos e da Europa enfrentam ciclones e turbulências. No Nordeste temos um verdadeiro tesouro.
Feitosa lembra ainda que o Nordeste é a região do planeta com melhor complementaridade eólica-hídrica. Os meses de junho, julho e agosto, quando ocorrem as menores vazões do Rio São Francisco, coincidem com a época em que o volume de ventos é abundante na região. O Velho Chico abastece oito usinas, que respondem por 90% da energia gerada no Nordeste.
O professor acredita que a energia eólica tem preço competitivo, em comparação a novas hidrelétricas e linhas de transmissão da Amazônia. O custo do megawatt/hora da eólica, diz ele, se equipara ao da hidrelétrica, se computados os custos ambientais e sociais:
- A usina eólica não exige despejo da população, e a área pode continuar sendo usada pela agricultura.
Um dos estados que abrigam as condições mais adequadas para o desenvolvimento da energia eólica é o Ceará. Sobre seus 573 quilômetros de litoral varrem os chamados ventos "bem educados", assim classificados porque têm duas características apontadas como vantagens competitivas na produção de energia eólica: velocidade e direção constantes.
O estado foi o primeiro a instalar usinas de geração de energia a partir dos ventos em escala comercial, nos anos 90. A produção atual de 17,4MW de seus três parques eólicos (Mucuripe, Taíba e Prainha) vai saltar para 500,53MW até 2008 quando deverão ser concluídas outras 14 usinas.
Todas as 14 usinas foram contratadas pelo Programa Federal de Incentivos às Fontes Alternativas de Energia Elétrica (Proinfa), implantado em 2002, e vão consumir R$2,1 bilhões em investimentos. Um grupo de investidores portugueses, ligados ao Citibank, e a fabricante de equipamentos argentina Impsa estão à frente de parte das usinas. A previsão do Proinfa é de 1.400MW de energia eólica instalados no Brasil até 2008, com investimentos de US$3 bilhões.
Capazes de atender a 50 mil residências, as três usinas cearenses em operação foram as primeiras no mundo construídas sobre dunas móveis com o know-how e equipamentos da Wobben Windpower, subsidiária da empresa alemã Enercon, fabricante de aerogeradores de grande porte. Segundo o gerente de vendas da empresa, Eduardo Leonetti Lopes, o potencial brasileiro foi o que atraiu para o Ceará.
- No Brasil há potencial, mercado e investidores interessados. O que definirá o tamanho do crescimento nos próximos anos é a garantia de compra e tarifas atraentes - diz Lopes.
Em três anos, com a conclusão das 14 novas centrais eólicas e a viabilização de mais uma usina com potência de 60MW no Complexo Industrial e Portuário do Pecém, o Ceará atingirá 577,9MW de energia eólica. Com base nesses números, o diretor de Infra-estrutura da Agência de Desenvolvimento do Ceará (Adece), Adão Linhares Muniz, afirma que, em 2010, o estado será auto-suficiente. Hoje, 98% da energia consumida vêm de fora.
Ainda segundo dados oficiais, a fonte eólica vai permitir a economia de 2,1 bilhões de metros cúbicos de água por ano, e um milhão de tonelada de dióxido de carbono deixará de ser jogada na atmosfera anualmente. Também haverá uma economia de R$336 milhões em investimentos de geração.
(O Globo – 21/10/07)

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