Gustavo Paul e Mônica Tavares
Depois de seis anos de estudos e quase nove meses de suspense, devido a questões ambientais e à ameaça de batalha judicial, em apenas sete minutos foi licitada, ontem, a concessão para a construção da usina de Santo Antônio, a primeira do Complexo do Rio Madeira, que fica na Região Amazônica, a última fronteira hidrelétrica do país. Franco favorito, o consórcio Madeira Energia - construtoras Norberto Odebrecht e Andrade Gutierrez, estatais Furnas e Cemig e bancos Banif e Santander - surpreendeu ao apresentar deságio de 35,3% sobre o preço máximo estabelecido para a tarifa. Com isso, a economia para a sociedade será de pelo menos R$20 bilhões nos 30 anos de concessão, podendo chegar a R$30 bilhões, caso seja considerada a potência máxima da usina, segundo cálculos da Secretaria de Direito Econômico (SDE) do Ministério da Justiça.
O consórcio ofereceu tarifa de R$78,89 por megawatt/hora, enquanto o preço máximo era de R$122. Mas, ao longo da concessão, as distribuidoras pagarão alguns centavos a menos: R$78,87. Pela regra, como o consórcio optou por vender uma parte da energia no mercado livre, terá de dar um desconto na tarifa cobrada das distribuidoras. O preço será reajustado segundo a inflação do período.
Reeditando o leilão de concessão de rodovias federais, ocorrido em novembro, os vencedores ganharam de lavada. As duas outras ofertas - eram três consórcios na disputa - foram de R$98,05 e R$94, deságios de 19,6% e 22,9%, respectivamente. Com isso, o leilão não passou da primeira fase. O Ministério de Minas e Energia não informou quais as ofertas feitas por cada proponente. Estavam na disputa os consórcios Energia Sustentável do Brasil (Suez Energy e Eletrosul) e Empresas Investimentos de Santo Antônio (Construtora Camargo Corrêa, Chesf, CPFL e Endesa).
As regras permitiam que os vencedores destinassem pelo menos 70% da energia aos consumidores comuns, que se abastecem das distribuidoras estaduais. Foi o percentual proposto pelo Madeira Energia. Os demais 30% serão vendidos no mercado livre, onde o valor da energia oscila de acordo com a oferta e a demanda. Por isso, observadores entendem que a estratégia do consórcio será elevar o preço nessas negociações, para compensar a outra tarifa mais baixa. O resultado do leilão também gerou, entre concorrentes e especialistas, a desconfiança de que o consórcio vá investir menos que o previsto ou de que sócios privados sairão do projeto.
Já o governo comemorou bastante o sucesso do primeiro grande leilão de uma obra de energia do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e admitiu que foi surpreendido com o lance. Esperava-se que o deságio não chegasse nem perto do obtido no leilão das rodovias, em que o desconto proposto no pedágio chegou a 65%.
A usina, que vai demandar R$10 bilhões de investimentos, segundo Irineu Meirelles, presidente do consórcio vencedor - o governo vinha falando em R$9,5 bilhões -, começará a ser construída entre o fim do primeiro semestre e outubro de 2008, e vai gerar energia no fim de 2012. Sua conclusão está prevista para 2016. A potência da usina é de 3.168 megawatts (MW).
Após a posse da presidente da Argentina, Cristina Kirchner, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse que se mostraram equivocadas as análises de que o leilão não se realizaria:
- Estou muito feliz, porque na concorrência da hidrelétrica do Madeira tivemos um deságio de 35%, que é uma coisa extraordinária, porque havia muita gente pessimista dizendo que não ia acontecer, não ia acontecer, e não só apareceram cinco empresas como o megawatt que estava previsto para ser US$116 foi US$78,9, que é um ganho. Em fevereiro vamos ter outro leilão e, se Deus quiser, não pararemos mais de ter leilões - disse, equivocando-se sobre os valores, a moeda das tarifas e a data do próximo leilão, de Jirau, que será em maio.
Eletrobrás também entrará em Jirau
Ciente de que a participação estatal foi decisiva para derrubar a tarifa, o governo informou que as empresas da Eletrobrás participarão da licitação de Jirau, porém ainda será estudado o modelo para outras usinas (como Belo Monte). O ministro interino de Minas e Energia, Nelson Hubner, comemorou:
- Não achei que conseguiríamos chegar a esse valor. É um resultado surpreendente e um momento histórico - afirmou, admitindo que acreditava em um valor pouco inferior a R$100.
Para Hubner, o baixo valor da tarifa, que irá financiar a construção da usina, não significa risco de interrupção nas obras ou problemas para a conclusão. Um dos fatores é a exigência de depósito de uma garantia de R$650 milhões até o cumprimento das obrigações da concessão.
- São grupos experientes que sabem suas responsabilidades. Não temos essa preocupação, pois exigimos garantias pesadas. Agora, como eles montaram sua engenharia financeira não nos preocupa.
Para a secretária de Direito Econômico, Mariana Tavares, foi o esforço do governo em garantir a concorrência que conseguiu reduzir a tarifa-teto:
- Que bom que ele (o consórcio) ganhou tendo competido arduamente. Essa é a prova mais concreta de que a concorrência é boa e garante economia para o bolso do consumidor.
Para Irineu Meirelles, o resultado coroou o esforço de seis anos de trabalho e muitos percalços. Em outubro, o grupo foi acusado pela SDE de adotar práticas anticoncorrenciais ao exigir cláusulas de exclusividade a fornecedores.
- A vitória é fruto de um estudo feito com muitos detalhes pela empresa e por Furnas - disse Meirelles.
O BNDES irá financiar 75% da obra, enquanto os demais 25% ficarão a cargo do próprio consórcio. A homologação dos vencedores ocorrerá no dia 19 de fevereiro.
COLABOROU Luiza Damé, enviada especial
(O Globo - 12/11/07)
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